Tuesday, July 18, 2006

NUDEZ – deles, os sonhos.

Seria a solidão a única realidade imutável? Porque depois de tantas tentativas de abraçar qualquer espaço confortável, não fui capaz de ter nenhuma vitória.

Mexo-me, remexo-me nas minhas histórias e delas todas só me aparece o infinito vazio. A dificuldade às vezes age como entorpecente, dependendo do grau de solidão enraizado no pensamento.

Deles todos, não há amor vivo ou ressuscitado, nem paz. Porque deles todos, os sonhos, não sobreviveu qualquer rumo ou qualquer vontade. Entupiram-se as veias dos desejos, como se uma tempestade de dor transformasse o poder do sangue em inútil líquido vermelho aguado.

A conseqüência dos minutos não passa de pura tristeza encurralada, trancafiada sem chaves de libertação.

Uma corrida de cavalos cegos. Um prêmio como a roupa do rei. Uma consciência de argila que não endurece, por isso nunca está segura.

Na profusão de abismos, o território é utopia. De concreto, só se descobrem mapas de uma terra inabitada.

Gavetas cheias de indiferença mofada, fedorenta, que causa alergia. Deles, nenhuma resposta.

Eles também não se sustentam. Perderam o guia inominável. Talvez um simples resultado de loucura não detectada. Deles, ainda tento arrancar os cacos.

É estômago, é ventre, é pulmão e é gozo. É exagero de humano, demasiado humano. É agonia.

Deles, o perfil me assusta. Levo um susto constante quando enxergo o ponto final. Um ponto final sem a sobrevida do ponto e vírgula. Crueldade.

Há cirurgias que evidenciam a mediocridade de tanto sangue, de tanta veia, osso, pêlo, pele, tecido. Pegam suas pernas, te cortam, te abrem, te tiram as tripas; te costuram e saem pra tomar um café. Comer um pedaço de bife suculento.

Sobra aquela grande quantidade de oxigênio passeando pelas estradas vermelhas do próximo segundo: vida.

Evacuar. Ingerir. Expelir. Absorver.

Filtrar?

Quais os seres humanos que aprenderam a filtrar e recolher o necessário? Os macacos?

Cuspir alivia. Por pouco tempo.

Humano demais é engano. Transcender o que nem foi atingido ainda? Reconsidere.

A humanidade está na terra, na chuva, no sol. Humanidade é o que se faz com o combustível que a natureza oferece.

Cuspir um tabuleiro não é o mesmo que parar de jogar. É indecisão.

Nudez? Vista-se com os mais pesados casacos, escolha um belo cachecol, botas de couro, passe uma espessa camada de maquiagem: essa será sua nudez mais reluzente.

A única nudez são as escolhas que fazemos. Deles, os sonhos.

2 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Daniela

Belo poema, sem dúvida. Você tem talento para a escrita.

Seu texto, no entanto, revela desencanto, solidão, desilusão. Referências ao Humano, Demasiado Humano. Nosso filósofo, o da Gaia Ciência, tentava amar a vida, odiando-a. As almas delicadas como a sua sofrem mais, nesse mundo duro. Sim, a única verdadeira nudez são nossas escolhas. Constrangedor, elas sempre são vistas por uma multidão de testemunhas.
Pense em Rilke, no "Cartas a um Jovem Poeta", quando diz, talvez em outras palavras (não me recordo bem agora) que não devemos culpar a Vida quando ela nos parece estéril. Nós é que não somos poetas o suficiente para encontrar nela o encantamento necessário.
A solidão por sua vez, como diria o Cazuza, é "pretensão de quem fica escondido, fazendo fita". Você terminou há pouco algum relacionamento ? Dói, dói muito, mas passa. Isso nos ajuda a ter sulcos na alma, os quais são a matéria prima de toda beleza duradoura, de toda paz legítima.
Não deixe o amargor dominar você, jamais. Seria o desperdício de uma grande pessoa, que, lendo seus lindos textos, vi que você é.

Abraços

Um "Caminhante", que apenas cruzou com você, por "acaso"

Wednesday, July 19, 2006  
Blogger Daniela González said...

"Caminhante", me diga quem és e vamos tomar um café.

Wednesday, July 19, 2006  

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