Friday, May 12, 2006

Uma cena sem título

Um cálice da minha vontade. Enquanto estive em desassossego, mergulhada na dúvida do possível, não precisei de nada. Horas eternas eram minutos suaves enfeitados com a purpurina da esperança. Olhei o passado. Pedi ajuda. Ali eu havia chegado, finalmente.

Caos, desespero. Afoguei-me no impulso de encontrar um sinal. Entrecortando as cenas, procurava o viés da sua face, que me traria a sabedoria. Por um instante, ultrapassei a barreira espinhosa da razão e, em prece, explodi a força de que precisava para tornar reais meus pecados.

A saudade mordia meus poros, mastigava toda noção de limite e engolia a seco o medo de abraçar a sua ausência. Decidi libertar os pudores. Corri no funil de uma ampulheta atrás de qualquer pedaço de você. A cada passo trêmulo, a cada rosto estranho estampado na fumaça do desconhecido, gritava a raiva de uma nova decepção. De costas, ereto como arbusto seco na umidade da floresta, eu enxerguei seu desenho.

Tudo o que eu queria estava a poucos passos do meu domínio. Trancafiei meu sorriso e fundi minha aflição com a surpresa radiante do seu corpo cristalizado, cheio de paixão contida e de desejo covarde. Respirei o prazer da sua companhia. Recordei-me do jogo, escolhi das cartas o curinga. Pareceu-me que haveria trégua. E num descuido ingênuo, vi sua displicência tentando mergulhar em outra boca. Fugi.

Outro final. Outra safra de verdades ácidas. Outra nuvem de desprezo cobrindo o brilho de qualquer estrela. Rodopiei no vazio solitário em que a superioridade me confortava. Trombei com sonhos e contos de fada costurados em linha pura de romances de algodão. Fiz sangrar meus joelhos em grãos metálicos sobre o chão da realidade que não me interessava. Adormeci.

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